Com o intuito de reduzir a espasticidade permanente e trazer mais qualidade de vida em crianças com paralisia cerebral, o projeto de cirurgias de Rizotomia Dorsal Seletiva operou, em 2019, seis crianças no Hospital Infantil Lucídio Portela. O projeto é encabeçado pelo neurocirurgião Francisco Alencar, um dos pioneiros no Brasil na realização da Rizotomia Dorsal Seletiva.

“Esse procedimento cirúrgico proporciona para as crianças com paralisia cerebral o tratamento à espasticidade (rigidez muscular) permitindo às que andam com dificuldade, melhorar a marcha; às que não andam, melhora posicionamento postural (nas cadeiras de rodas, reduzir dor e gasto energético, evitar deformidades, como luxação de quadril e escoliose), propiciar ganho de peso com redução do gasto energético pelo estado de rigidez (contração muscular) mantido”, explica.

Uma das crianças beneficiadas pelo projeto foi o pequeno Heitor Morais, de 3 anos de idade, que passou pela cirurgia no dia 29 de novembro, e com pouco menos de um mês a avó do garoto, Cioneide Morais, já nota a diferença na qualidade de vida do menino. “Ele já tá mexendo as pernas, o que antes não fazia, comendo melhor, o que deixa a gente muito animada. Ver a evolução dele após esse tratamento é de grande alegria”, enfatiza a dona de casa.

 

Seguindo a proposta internacional de implantação de Rizotomia Dorsal Seletiva para tratamento de espasticidade em crianças com paralisia cerebral, o Piauí é o único estado que adotou projeto semelhante, graças a liberação de R$ 363 mil em recursos por parte da Secretaria de Estado da Saúde (Sesapi). “Isto é fator transformador das vidas destas crianças. Esperamos que outros estados, se possível todo o Brasil, instituam também esta linha de saúde pública”, lembra o neurocirurgião Francisco Alencar.

A rizotomia dorsal seletiva é um procedimento neurocirúrgico introduzido na América do Norte no início dos anos 1980, sendo aplicado e desenvolvido em outros países posteriormente, e se baseia na redução da estimulação sensitiva periférica através da secção parcial das raízes dorsais dos nervos espinhais. É o único tratamento capaz de reduzir a espasticidade permanentemente, e por isso, tem eficácia superior ao uso de toxina botulínica quando é necessário um relaxamento muscular amplo e permanente nestes pacientes.

“ É um grande desafio encontrar o tratamento certo, no momento certo, para cada criança com paralisia cerebral, se não considerarmos a dinâmica das alterações funcionais em cada um destes pacientes. No CEIR realizamos o tratamento com toxina botulínica, mas dependendo do quadro da criança, o mais recomendável é a rizotomia”, lembra Francisco Alencar.

No Piauí, o tratamento ambulatorial da espasticidade nas crianças com paralisia cerebral é realizado no Centro Integrado de Reabilitação (CEIR ) e as cirurgias são realizadas pelo Serviço de Neurocirurgia Pediátrica do Hospital Infantil Lucídio Portella – único hospital público infantil de alta complexidade do Estado do Piauí, que é a referência em Neurocirurgia Pediátrica. “ Nossa intenção para 2020 é ampliar ainda mais esse projeto, alcançando 38 cirurgias durante o ano. Desde que foi implantado em 2016, o projeto já beneficiou 15 crianças que tiveram um avanço em sua qualidade de vida”, disse o médico.

A paralisia cerebral é a resultante final de uma lesão não progressiva sobre o encéfalo em crescimento, podendo desencadear diversas alterações do desenvolvimento neurológico (cognição, percepção sensorial, habilidades motoras, entre outras). Destas, a espasticidade é a anormalidade motora mais comumente observada, com incidência entre 75% a 88% dos casos.

 

Espasticidade é habitualmente definida como um transtorno motor caracterizado por exacerbação do reflexo tônico de estiramento muscular dependente de velocidade, e clinicamente pode ser observada como espasmos musculares dolorosos, reflexos exaltados, com comprometimento na cinética, na destreza e no controle do movimento, evoluindo cronicamente com encurtamentos músculo-ligamentares levando a deformidades articulares com postura corporal anormal, deformante e estruturada, com prejuízo na higiene corporal e em outros cuidados diários

Os critérios para inclusão das crianças no projeto são: ser maior de dois anos de idade e com diagnóstico de paralisia cerebral, apresentar espasticidade dinâmica nos membros inferiores, afetando a função e a mobilidade deve ser prioridade, não haver evidência de doença progressiva genética ou neurológica e estar em tratamento de reabilitação. “Como critério de precedência, para realização da cirurgia, são usados tempo de espera e critérios clínicos para definição da sequência das cirurgias”, disse Dr. Francisco Alencar.